domingo, 22 de setembro de 2013

Lembranças

Jullie estava em um momento simples, comum. Estava apenas tomando seu café diário e, por sempre estar preocupada, estudando para a prova que teria alguns dias depois daquele. Estava concentrada, compenetrada no livro à sua frente e na xícara de café já frio ao seu lado. Foi quando algumas daquelas palavras chamou sua atenção. Olhou para os lados ansiosa, procurando a origem da voz que a distraiu, e finalmente conseguiu enxergar uma menina muito bonita, de uns catorze anos, com lágrimas escorrendo dos olhos, tão azuis que ela podia ver do outro lado da cafeteria, encarando fixamente o tampo da mesa, enquanto um menino bastante charmoso, aparentemente seu irmão, a abraçava. Ela contava a ele sobre seu mais recente amor, que a havia deixado por uma qualquer. O menino, que aparentava um ou dois anos a mais que a menina, tinha em seus olhos castanhos uma expressão de raiva acompanhada de compaixão. Percebia-se facilmente que aquela que estava em seus braços era seu maior tesouro. Jullie largou a página de seu livro que ainda segurava e, por um momento, lembrou-se de uma de suas decepções amorosas. A que menos tinha durado mas, mesmo assim, havia deixado marcas inapagáveis. Lembrou-se do quanto sofreu por um moleque do qual ela nem mais possuía o telefone. Naquela época isso parecia tão grande! Tão impossível de ser curado… Teve vontade de caminhar até a garota e contar a ela sua história. Explicar a ela que hoje - com seus vinte anos e sua vida tão ocupada e preenchida com a faculdade de jornalismo, o estágio em uma grande rede de jornais e a ONG da qual era voluntária no tempo livre - o máximo que ela sentia daquela época em que sofreu por um moleque era nostalgia. Sim, nostalgia até mesmo da tristeza, pois aquele era um sentimento nobre. Só ficam tristes aqueles que se entregam. Ainda escutando a conversa do casal, observou-os atentamente. Sorriu enquanto o menino enxugava as lágrimas da menina, pois viu o olhar do mesmo. Percebeu que o menino, na verdade, não era irmão da menina frágil em seus braços. Seu curso de interpretação de expressão corporal, feito ao mesmo tempo que tantos outros apenas para ocupar sua cabeça na época em que sofria por um moleque, a ajudou naquele momento a decifrar o amor escondido que havia naquele menino. E Jullie então percebeu que aquele casal tinha um longo futuro pela frente, e que o menino cuidaria muito bem do tesouro que tinha nos braços. Recolheu suas coisas, levantou, dirigiu-se até o caixa e, no caminho, sorriu para o menino que a fitava curioso. Ela pagou sua conta e foi embora, certa de que aquela menina um dia estaria tão bem quanto ela estava naquele momento.